segunda-feira, 22 de março de 2021

Visita ao mestre caricaturista Mendez

 

André Brown

O interesse pelo desenho e pela caricatura começou cedo para mim. Sempre fui fascinado pelas caricaturas que via nos jornais. Mesmo quando não lia as matérias, ficava olhando para aquelas caras engraçadas e distorcidas e tentava reproduzi-las, acreditando que os caricaturistas as tinham executado diretamente nas páginas do jornal. Como os meus desenhos, na maioria das vezes, não saíam bons, ficava a frustração e o desconhecimento das técnicas necessárias para fazer boas caricaturas.

Até que, um dia, meus pais me deram de presente um pequeno livro intitulado “Como fazer caricaturas” do caricaturista Mendez publicado pela editora Ediouro. Através de seu livro, Mendez foi meu primeiro mestre na arte da caricatura. O livro trazia vários exercícios de construção da figura humana, sempre de uma forma bem humorada, com um traço firme e preciso. Aquele livro foi a referência que precisava para começar a fazer caricaturas de meus colegas e professores.

Lembro-me de um rígido professor de matemática da escola técnica, que tomava de mim as caricaturas que fazia dele durante a aula e me chamava a atenção cada vez que isso acontecia, mas guardava os meus desenhos na pasta dele. Uma vez, depois da aula, o flagrei num corredor da escola vendo e rindo de uma das caricaturas que eu tinha feito dele.

Anos mais tarde, tive a oportunidade de conhecer pessoalmente o mestre caricaturista Mendez, em uma visita à sua casa na tarde de 12 de janeiro de 1996, levado pelo caricaturista Zé Roberto Graúna. A casa do artista era repleta de desenhos, caricaturas, pinturas e esculturas. Pude, também, ouvir as histórias contadas pelo Mendez e sua esposa Dona Emilia sobre trabalhos, viagens e a relação dele com outros artistas como o Portinari, de quem foi assistente de pintura durante a obra artística decorativa do Palácio Gustavo Capanema, antiga sede do MEC na cidade do Rio de Janeiro, quando ainda era capital da República. O Mendez disse, nessa conversa, que o Portinari era bastante crítico e sempre que necessário o lembrava de que aquele trabalho era de pintura e não de caricatura.

Na ocasião da minha visita, Mendez já estava idoso e não desenhava mais. Falei para ele da importância do seu trabalho para me estimular a desenhar caricaturas desde criança e que, na minha vida de professor, eu utilizava o seu livro com os meus alunos das minhas oficinas de desenho. Mendez percebeu que eu tinha um exemplar do seu livro em mão, “Caricaturas e caricaturados”, também da Editora Ediouro. Com muito esforço, ele, então, levantou-se de sua poltrona pegou meu livro e dirigindo-se até a mesa espontaneamente autografou para mim na página inicial. Com dificuldade, conseguiu escrever uma curta dedicatória, “Ao André com amizade do Mendez”, para mim bastante significativa, pois, segundo a esposa dele, Dona Emília, o Mendez não tentava escrever ou desenhar há algum tempo por não se conformar com o tremor nas mãos. Acredito que tenha sido o último autógrafo do Mendez, que faleceu aos 88 anos, em outubro de 1996.



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